Paulo Venâncio Filho

Perspectivas Recentes Da Escultura Contemporânea Brasileira

Galeria Sergio Milliet (Outubro 1988)

O que se pretende colocar em questão é a escultura. Mais do que isso: trata-se de apresentar as possibilidades atuais de escultura. O momento de destruição dos cânones clássicos pelas radicais ações modernas não foi só uma total reformulação do tema, do objeto e das técnicas; foi também uma subversão do lugar da escultura. Pode-se dizer que, a partir daí, como se submetida a devastadoras forças centrípetas e centrífugas, ela foi deslocada de sua posição paradigmática: centro do espaço. Suprimida a verticalidade originária, desfeita a base, encontrou-se na situação de um sólido subitamente tornado líquido; disforme, sujeita a assumir qualquer forma. Nesse momento, errante e errática, descentrada e incerta, parece experimentar, pela primeira vez, sua a- espacialidade, sua abertura virtual para todos os espaços. Difícil, então, estabelecer uma tendência, uma linha única, indivisível, uniforme. O que se apresenta nesses trabalhos é uma pluralidade de perspectivas. Cada um indica uma gênese distinta, uma direção própria. Entretanto, se aproximam na atitude de se relacionar com o espaço, de enfrentar as indefinidas possibilidades do espaço. Este não é mais algo único, indivisível, uniforme: é múltiplo, divisível, pluriforme. É dimensão, posição, relação: relativização. Assim a fronteira entre obra e espaço torna-se fluida, flexível, elástica. Trata-se de um diálogo entre virtualidades simultâneas. O espaço deixa de ser um a priori, um dado absoluto e imutável; é construção, processo análogo ao fazer da obra.

Estes trabalhos também estão próximos na maneira como dispõem dos materiais, experimentando a potencialidade e possibilidade de qualquer material. Cada matéria que é em si forma inerte, assume aqui uma presença, um modo ativo de impor-se. A primeira condição de toda escultura — dimensão e posição — soma-se também diferenças de materiais, de texturas, de pesos. Passagens de quantidade à qualidade: fluxos.

Encontramos nessas esculturas, tão diversas e tão próximas, um princípio de liberdade, um não-dogmatismo: experiência aberta.

© Paulo Venâncio Filho