Marc Pottier

DENTRO/FORA

Galeria Hugo França – Trancoso (Abertura 6 de julho 2024)

Artista brasileira, mas cujo playground é o mundo, autodidata, Frida Baranek adora desafio confrontar a diversidade e as transformações que a vida oferece. A exposição Dentro/Fora, na Galeria Hugo França, em Trancoso, é uma fantástica oportunidade para descobrir como artista, desde 1984 até hoje, conseguiu criar uma obra escultórica “anti-forma” que abraça sua intimidade as evoluções de uma vida nômade que a levou do Brasil aos Estados Unidos passando por vários países europeus. Aquela que sempre se sente meio por dentro e meio por fora, soube fazer a vida circular através das suas obras.

“Quando as atitudes se tornam forma
A exposição DENTRO/FORA é uma exposição que tem como objetivo mostrar a trajetória d uma artista que teve que, e que quis montar seu ateliê nos quatro cantos do mundo, desde su primeira exposição individual na Petite Galerie no Rio, em 1985, até hoje, morando entre Brasil e Portugal. Olhando para a sua obra num inventário ‘à la Prévert’, chama atenção a grande diversidade de materiais utilizados, numa obra essencialmente escultórica (tela de aç galvanizado, acrílico, vidro e metal; sobras de materiais como alumínio, tubos de cobre, varetas de vidro, corda de sisal, verniz de carro de efeito camaleão sobre fibra de vidro, arames de aço chapa, látex, pedras, madeiras…) e vêm à mente as imagens da exposição “referência”: “Quando as atitudes se tornam formas”, que o grande crítico suíço Harad Szeemann organi na Kunsthalle de Berna em 1969. Na obra de Frida Baranek, os seus gestos parecem ter precedência sobre a obra. Suas esculturas, sem base, diretamente no chão, evocam os artista italianos da Arte Povera. Pois há um aspecto “não fixo” nelas, como se fossem evoluir ao long do tempo e espaço nos quais são exibidos.

Anti-For
Frida poderia perfeitamente ter feito parte do movimento American Anti-Form do final dos a 1960, com uma obra escultórica flexível, por vezes beirando o perecível. Pensamos nas reflex do grande artista americano Robert Morris (1931-2018) que questionou sobre o papel
matéria na determinação da forma final. Na esteira de Georges Bataille, que defendeu a noçã de ‘sem forma’ (informe) (desforme?) e o seu poder de rebelião contra o desejo de impor uma ordem às coisas, Robert Morris criticou a escultura ocidental que, segundo ele, sempr submeteu a matéria a uma ordem que é externa a ela. Frida Baranek segue sugerindo, o contrário, ou seja, valorizar a matéria, mostrando-a como ela é, aproveitando as suas imperfeições e até acompanhando a sua tendência para a entropia. Falando de seus mentores, Frida cita a artista americana de origem alemã Eva Hesse (1936-1970) que levou ao auge revalorização da matéria e de suas qualidades.

Tanto nas obras de Eva Hesse como nas da Frida Baranek, as suas esculturas nunca param de falar de suas autoras, das suas angústias, das suas obsessões, das suas vidas com múltip experiências. Sob a simplicidade das aparências das formas, a autobiografia brilha de inúmera maneiras. A variedade de materiais utilizados não serve para a construção de volumes perfeitos lisos e simétricos, mas para a fabricação de objetos totêmicos carregados de reminiscências de vidas lançadas.

Dentro/Fora
Na experiência corporal da qual normalmente temos consciência, a separação entre interior e exterior, entre “eu”, “minha alma” e “o mundo”, parece pré-estabelecida. Os objetos, os outros, estão lá “fora”, diferentes de nós que estamos aqui, com nossas percepções, emoções e pensamentos que parecem localizados “dentro”. Esta separação entre mundo objetivo e mund subjetivo, longe de ser algo alcançado, pode ser o resultado de uma evolução. Esta exposiçã coloca a questão, a do processo de separação dos polos, subjetivo e objetivo vivido como experiência de permeabilidade que a artista pode vivenciar e depois oferecer ao público. A vid de Frida Baranek a levou pelas estradas do mundo, primeiro como estudante de arte entre o Rio, São Paulo, Paris e os Estados Unidos, depois como esposa seguindo um marido jornalista em Paris, Berlim, Nova York e Londres, e finalmente como uma mãe com dois filhos que ag moram em Madrid e Washington DC… A cada vez ela teve que se adaptar, acomodar a família, para só depois reconstruir seu ateliê ao mesmo tempo que desvendava novas culturas. Esta exposição mostra as suas repetidas experiências de escuta, com a construção de um ‘Dentro’ partir daquilo que sempre vem de ‘Fora’. Esta exposição, através de um percurso de obra criadas ao longo de mais de 30 anos, mostra a dissolução de fronteiras, associada a uma transformação do sentido de identidade da artista. É na dimensão sentida desta exper que está na fonte dos seus pensamentos, que a sua relação original com o mundo parece desenrolar-se. Nesse processo, sujeito e objeto, dentro e fora, e os pontos de referência que costumam ajudar a estruturar o mundo, perdem sua solidez, sua rigidez e tornam-se cada vez mais leves. Dentro/Fora mostra como as obras de Frida Baranek, num espaço mental desobstruído, permitem a respiração, e que a vida circule.

Frida Baranek produz trabalhos com ressonância profundamente pessoal, tecidos a partir d suas próprias memórias. Ela reivindica total liberdade, num trabalho inteiramente voltado para a exploração de si mesma. Podemos vivenciar a exposição Dentro/Fora como o diário íntimo d uma artista feminina (com todas as dificuldades que isso ainda representa) que se nutre todas as influências das culturas em que ela esteve imersa. Mas a artista nunca é prisioneira referências, Dentro/Fora é a história de uma vida que ela nos convida a compartilhar na Galeri Hugo França em Trancoso.

Marc Pottier